27 Junho 2009 - Assembleia-geral extraordinária


CONVOCATÓRIA


O Presidente da Mesa da Assembleia-geral do Cineclube de Amarante convoca todos os sócios para a Assembleia-geral extraordinária que terá lugar no dia 27 de Junho de 2009, pelas 09:30 horas na Casa da Juventude e da Cultura, com a seguinte Ordem de Trabalhos:
1. Discussão do valor da quotização;
2. Campanha de angariação de sócios.
Se à hora marcada não estiver presente a metade dos sócios inscritos, a Assembleia abrirá os trabalhos uma hora depois com qualquer número de presenças.

Amarante, 10 de Junho de 2009

A Presidente da Mesa da Assembleia-geral do Cineclube de Amarante
Isabel Amélia Sardoeira Silva

26 Junho 2009 - Gran Torino


Título original: Gran Torino

De: Clint Eastwood
Com: Clint Eastwood, Geraldine Hughes, John Carroll Lynch
Género: Drama, Thriller
Classificação: M/12
Origem: EUA
Ano: 2008
Cores, 116 min

Site

Caros,

Antes de irmos todos a banhos, temos um dos melhores filmes do ano para ver: Gran Torino de Clint Eastwood.

Clint Eastwood é um realizador querido (amado) do Cineclube de Amarante. Todos os filmes que realizou a partir de 1995 (ano da criação do Cineclube) foram exibidos na sala do Cinema Teixeira de Pascoaes.

Recordo:
1995, The Bridges of Madison County, As Pontes de Madison County.
1997, Absolute Power, Poder Absoluto.
1997, Midnight in the Garden of Good and Evil, Meia-Noite no Jardim do Bem e do Mal.
1999, True Crime, Um Crime Real.
2000, Space Cowboys.
2002, Blood Work, Dívida de Sangue.
2003, Mystic River.
2004, Million Dollar Baby, Sonhos Vencidos.
2006, Flags of Our Fathers, As Bandeiros dos Nossos Pais.
2006, Letters From Iwo Jima, Cartas de Iwo Jima.
2008, Changelling, A Troca.

(lista a conferir no catálogo Clint Eastwood: um Homem com Passado, organizado por Maria João Madeira, Cinemateca Portuguesa, Dez. 2008)

Se me permitem uma breve nota pessoal, ainda vos digo que um dos filmes da minha vida é As Pontes de Madison County, um drama como aqueles que se faziam no tempo em que o “cinema era belo”. Até Fevereiro de 1996, quando num o fim-de-semana o filme foi programado e exibido pelo Cineclube para 203 espectadores, até essa data, dizia eu, nunca tinha visto filmar assim renúncia igual: o sacrifício dos amantes pelo dever. Depois…também não. Ainda vou comprar o DVD…

Todos os filmes realizados por Clint Eastwod são bons. Muito bons até. Mas todos.
Gran Torino. Não tenho (ainda?) a certeza que seja a obra-prima de que se fala. Há uma ou duas personagens um pouco estereotipadas que me deixam a remoer. Na próxima 6ª feira, quando o revir pela 3ª vez, direi coisas.
Uma certeza tenho, no entanto. Como diz LMO, este filme tem o mais belo genérico final do cinema americano das últimas décadas. Falamos no final?

Adiante. Em Julho e Agosto temos a sala fechada. Regressamos no dia 4 de Setembro. Temos tantos filmes para ver! Os 2 filmes que Steven Soderbergh fez sobre Che Guevara. A Mulher sem Cabeça de Lucrecia Martel. O lindíssimo Almoço de 15 de Agosto do italiano Gianni Di Gregório (quem não quiser esperar, sempre pode vê-lo esta semana no Teatro Campo Alegre).
Por exemplo.

Se quiserem sugerir algum em especial para a rentrée…estejam à vontade.

Obrigado, bom filme e boas férias.

Manuel Carvalho




Vasco Câmara, in PÚBLICO, 12 de Março
Espécie ameaçada de extinção nos seus filmes, em "Gran Torino" Clint extingue-se. Sempre a sabotar-se, Clint, incorrigível masoquista. Espalhem ao vento: é uma obra-prima.
Entreguem à brisa de Verão, que já sopra, as cinzas de Joe, Blondie, Walt Coogan, McBurney, Harry Callahan, Josey Wales, Bronco Billy ou William "Bill" Munny, estes e todos os nomes com que Clint Eastwood falou do fundo do seu coração de "dinossáurio", individualista que não reconhece o mundo que o rodeia, corpo de outro tempo, em apuros e sempre desejoso de se colocar em apuros.
Enfim, entreguem à brisa de Verão estes e outros nomes a que Clint Eastwood deu o corpo, ferozmente, fazendo dele ecrã de desadequação, raiva. Espécie sempre ameaçada de extinção, em "Gran Torino" extingue-se.
"Requiem" por si próprio, por aquilo que construiu (sempre a sabotar-se, Clint, incorrigível masoquista), este é um adeus às armas. Não por se anunciar aqui a sua última presença, aos 78 anos, como actor (esse é um daqueles "anúncios" que foi sendo espalhado, como que pelo vento, não se sabe bem vindo de onde, e nem se pode jurar pela irreversibilidade da "decisão"), mas por as coisas se darem a ver aqui a partir de uma estação terminal: é um filme em que um viúvo, um reaccionário, um veterano da guerra da Coreia zangado com a vida e com o bairro, que já não reconhece porque está infestado de "gangs", foi invadido pelos imigrantes, já ali não há "americanos" - eis Walt Kowalski/Clint Eastwood -, prepara a sua saída de cena; é um filme tomado por esse clima de antecâmara que precede a rendição final, e é desta forma que Eastwood se despede do(s) seu(s) Kowalski(s): abre o peito à auto-ironia, melhor forma de alguém se desprender do que lhe pertenceu, assume a sua exterioridade face ao mundo e àquilo em que ele se tornou (é ainda a negociação do desprendimento), e, sem ceder à nostalgia, embala a coisa com suaves cintilações. Como uma canção, como a brisa que sopra neste delapidado bairro onde o fulgor do passado, a imagem dourada que dele foi construída - é que a memória pode transformar o inferno no paraíso, e isso aconteceu aos anos 40 e 50 de Kowalski -, é já só fantasma. Mas essa "presença", chamemos-lhe assim, um cineasta como Clint consegue filmá-la. É esse o grande passo em frente de "Gran Torino", consigo levando todo o património de uma "persona" que neste filme desagua: revelar o fantasma que se intromete na imagem, que nela cintila como brisa, indo atrás dele, seguindo-o e passando, finalmente, para o "lado de lá".
(Parecerá absurda a associação, mas aqui vai, é uma associação entre dois filmes invadidos por fantasmas: se "Milk", de Gus Van Sant, mostra os anos 70 para falar do presente, que é, na verdade, o fantasma que se intromete na imagem, "Gran Torino" passeia a câmara pelo presente em ruínas para revelar o mundo que ali está desaparecido.)
Podemos, para encontrar conforto, dizer que "Gran Torino" é a história de uma aprendizagem, de uma passagem de testemunho. Que Kowalski "educa" o seu reaccionarismo e xenofobia quando se encontra mais em família com os seus vizinhos asiáticos do que com a sua própria família. E que por aqueles vai ser capaz do gesto sacrificial, redentor.
Mas por quem se sacrifica, afinal, Kowalski: pela família de adopção ou por si próprio? Quem ajuda quem? A "verdade" de todos os Kowalskis de Eastwood, o seu masoquismo, se quisermos, está na extrema fidelidade à sua natureza. A de Kowalski, e isto desde a primeira sequência, no funeral da mulher, é a de ser fantasma. Condição que ele vai cumprir. E a que Clint Eastwood, cineasta, vai ser fiel: com a personagem, com o filme, está sempre do "lado de lá", feroz, fielmente. É por isso que o plano final chega-nos como teimosa oferenda do outro mundo - servida com canção a preceito - e como cintilação de um cinema de outro mundo: aquele, dos anos 50, o clássico, que já morria quando Clint Eastwood, jovem actor, chegou a Hollywood. Como se a Kowalski pertencesse sempre a última palavra.
Espalhem ao vento: "Gran Torino" é uma obra-prima.

Luís Miguel Oliveira in PÚBLICO, 13 de Março
Que acrescentar sobre "Gran Torino"? Que Clint se diverte (mas diverte-se muito seriamente) a brincar com a sua "aura", a girar entre o seu lado assustador, quase "fora de controlo" (a cena em que primeiro salva a rapariga asiática), e a proximidade reconfortante com que se encarrega da "educação" do miúdo? Que "Gran Torino" trabalha conscientemente uma "súmula", em simultâneo revisão e reiteração (donde, a sua extraordinária complexidade) do rasto que Clint foi deixando em quarenta anos de filmes como realizador e como actor?
Que o tratamento dos espaços da acção, e da sua articulação com a tensão própria das personagens, na curta escala de uma rua (e pouco mais), é prodigioso? Que tem o mais belo genérico final do cinema americano das últimas décadas? Ou repetir, apenas, "espalhando ao vento": é uma magnífica obra-prima.


O texto seguinte foi publicado no jornal Diário de Notícias a 12 de Março de 2009.
Clint Eastwood, realizador e intérprete de «GRAN TORINO», falou em Paris com João Lopes sobre este filme, em que personifica um veterano da guerra da Coreia, misantropo e rude, que protege dois jovens vizinhos asiáticos de um
`gang` étnico que aterroriza o bairro onde vivem. «Gran Torino» é nesta altura o maior sucesso comercial de toda a carreira de Eastwood.

O encontro com Clint Eastwood aconteceu em Paris, nos cenários acolhedores do Hotel Bristol, perto dos Campos Elíseos. Tendo em conta que muitas entrevistas “internacionais” se tornaram mini-conferências de imprensa, com seis (ou mais)
jornalistas, foi simpático poder conversar durante cerca de meia hora com o autor de Gran Torino, partilhando o diálogo apenas com um colega, Ioannis Zoumboulakis, do jornal grego To Vima. Tudo indica que esta contenção decorre de exigências do próprio Eastwood, até porque, ao contrário do que faz a grande maioria dos realizadores e actores americanos, ele não veio à Europa para dar entrevistas televisivas.
Discreto e contido nos seus 78 anos, Eastwood mostra-se também disponível para a deambulação e a ironia. A sua presença integra, sem crispação, a metódica passagem do tempo que temos vindo a descobrir nos filmes. Veste-se em tons suaves, castanhos e esverdeados, apenas os ténis, desatados e de cores mais contrastadas, contrariando
a neutralidade da pose.
Quando, num paralelismo com Gran Torino, evoco Bronco Billy (1980), crónica desencantada sobre um circo que mima as glórias do velho Oeste, é evidente a ternura que Eastwood sente por esse filme tão esquecido (e, na altura do seu lançamento, tão mal amado). Mas não há nele qualquer ressentimento. Trata-se apenas de "continuar a aprender". E o seu próximo filme, The Human Factor (sobre Nelson Mandela), irá reflectir essa mesma disponibilidade.

Já na despedida, falamos da sua admiração por Manoel de Oliveira que conheceu, em Maio do ano passado, no Festival de Cannes. Uma das pessoas do staff da Warner recorda-se de, também em Cannes, ter ouvido a “lenda” segundo a qual Oliveira não terá 100, mas já 102 ou 103 anos. Com timing perfeito, e em tom muito carinhoso, Eastwood comenta: “Se calhar está a mentir sobre a idade, a ver se lhe servem uma bebida no bar”.


O seu primeiro filme, «Play Misty for Me» («Destino nas Trevas») foi feito em1971. Desde então, qual o papel da sua companhia, Malpaso, no seu trabalhocomo realizador?
A Malpaso deu-me a independência, precisamente quando eu mais precisava dela. Estava empenhado em não fazer filmes sempre do mesmo género: gostava muito dos westerns que fiz, com Sergio Leone e outros, mas queria também realizar e experimentar coisas diferentes.

Mas até mesmo em «Gran Torino» há uma componente de western, quanto mais não seja por causa do tema da terra e da propriedade.
A minha personagem, Walt Kowalski, é um homem que lutou pelo seu país e se reinstalou onde vivia. Agora, depara com uma vizinhança que já não é predominantemente de origem polaca, como ele, mas asiática, da comunidade "hmong". O filme é sobre os seus preconceitos e a maneira como os acontecimentos o impelem a agir. Mas é também sobre o momento em que, por vezes, os mais novos se tentam livrar dos velhos, colocando-os em instituições. Claro que ele é o primeiro a reconhecer que não terá sabido estabelecer uma relação com os filhos. O certo é que descobre naquele obscuro grupo asiático outro respeito pelos mais velhos. Daí que um dia se olhe no espelho e diga: "Tenho mais em comum com esta gente do que com a minha desgraçada família". Podia ser um western. Mas é também muito contemporâneo.

Nesse sentido, aceita que se diga que o filme é testemunho sobre o actual
melting pot americano?
Sim. Mas é também sobre o reconhecimento de que é possível aprender coisas novas em todas as idades: é sempre possível aprendermos a tolerância em relação aos outros. O que, em todo o caso, não impede a minha personagem de estar em conflito com a sua igreja e também com a família.

Podemos encarar o filme também como uma visão sobre a religião?
Kowalski provoca o padre, mas o certo é que as coisas vão mudando e ele acaba por ir à confissão. O interessante é que tudo isso abre novas possibilidades de vida. Na verdade, não tenho de me reconhecer em nada do que é contado, são apenas coisas que gosto de representar. Aliás, por vezes, é muito mais divertido representar pessoas com as quais nada temos em comum.

O elenco de «Gran Torino» é quase todo composto por amadores. Que diferenças há entre trabalhar com actores sem experiência profissional e alguém, por exemplo, como Angelina Jolie?
Bem, é um prazer trabalhar com Angelina Jolie... No caso de «Gran Torino» comecei por pensar em actores profissionais de origem asiática. Até que senti que valia a pena procurar no interior da própria comunidade "hmong". Deparámos com muita gente disponível, ansiosa por entrar no filme. E acabei por encontrar os dois jovens (Bee Vang e Ahney Her) que, de facto, tinham um "não sei quê" de especial.

Apesar do sucesso, antes do mais nos EUA, não se pode dizer que «Gran Torino» seja um típico filme de Hollywood. Como realizador, e como espectador, qual é a sua relação com os filmes de acção, dominados por efeitos especiais?
Os efeitos especiais são magníficos. Os efeitos visuais, em particular, evoluíram imenso e eu próprio os tenho usado, por exemplo em «As Bandeiras dos Nossos Pais». Mas, para mim, é a história que conta. Não me interessa fazer esses filmes de efeitos especiais como uma espécie de ginástica. Gosto das histórias. Cresci a ver filmes com histórias. Por exemplo, no caso de «A Troca» tive de usar alguns efeitos para recriar Los Angeles em 1928, mas era a história que
valia. Cada filme tem que ter algo que seja apelativo, uma história que valha a pena contar.

João Lopes

19 Junho 2009 - O Leitor


Título original: The Reader
De: Stephen Daldry
Com: Ralph Fiennes, Jeanette Hain, Kate Winslet
Género: Drama, Thriller
Classificação: M/16
Origem: Alemanha/EUA
Ano: 2008
Cores, 125 min
Site


Sinopse
No final da Segunda Guerra Mundial, o jovem Michael Berg adoece e é tratado por uma bela e misteriosa mulher mais velha, Hanna (Kate Winslet). Quando os dois se reencontram, apaixonam-se e a relação intensifica-se à medida que Michael lê para Hanna obras clássicas. Mas Hanna volta a desaparecer. Oito anos depois, Michael (Ralph Fiennes) é aluno de Direito e acompanha os julgamentos dos crimes de guerra cometidos pelos nazis. É aí que descobre que a mulher que tanto amou escondia segredos que afectarão por completo a vida de ambos.

Crítica
Jorge Mourinha in PÚBLICO, 12 de Fevereiro
Por esta altura, já se percebeu como a adaptação por Stephen Daldry ("Billy Elliot", "As Horas") do romance de Bernhard Schlink, milimetricamente programada à distância para fazer boa figura nos Oscares, foi perseguida pela turbulência: Nicole Kidman começou por substituir Kate Winslet, comprometida com "Revolutionary Road", mas saltou fora quando as rodagens de "Austrália" se atrasaram, e Winslet entretanto livre regressou ao filme; o adolescente David Kross, sem experiência de representação, teve de aprender inglês (que não falava) e a produção teve de aguardar que ele chegasse à maioridade legal para arrancar com as filmagens; o director de fotografia Roger Deakins teve de abandonar as rodagens a meio para ir filmar "Dúvida", sendo substituido pelo mestre Chris Menges; os produtores, Anthony Minghella e Sydney Pollack, faleceram durante a produção; Daldry montou o filme a par com os ensaios da sua transposição para a Broadway da versão musical de "Billy Elliot", levando a um choque com os temidos irmãos Weinstein, co-produtores do filme; Scott Rudin, outro dos produtores, retirou o nome do filme na sequência (também aqui) de choques com os Weinstein...
Há um ditado inglês que, traduzido à letra, diz "demasiados cozinheiros estragam o prato", e com tanta confusão e turbulência de produção seria legítimo esperarmos um prato mal amanhado. Mas não foi nada disso que aconteceu: cerebral, meticulosamente pensado até ao ínfimo pormenor, a história do tórrido caso de Verão entre um liceal precoce e uma revisora de autocarros na Alemanha do pós-II Guerra Mundial - e do modo como os segredos do passado nazi vêm alterar "a posteriori" essa experiência - é um filme singularmente perturbante. Não porque haja aqui uma marca de realizador (e não há; antes um certo anonimato de "qualidade britânica") ou interpretações de estarrecer (mesmo que Kate Winslet seja maravilhosa, como sempre, embora no seu caso isso seja o mínimo que se possa esperar). Antes porque Daldry e o seu argumentista, o dramaturgo David Hare, fazem desta história de amor esquiva e profundamente equívoca uma meditação sobre a moral, a justiça, a vergonha, o passado, a História, o dever. Onde nunca nada é o que parece e tudo parece construído sobre areias movediças, numa sucessão de camadas que vão lentamente caindo, como uma flor malsã que só revela a sua natureza profunda depois de desabrochar por completo, mas sem escamotear que o que aqui se joga é, tudo, demasiadamente humano.
Reveladora, a esse nível, é a cena do julgamento em que Winslet faz a pergunta-chave que norteia todo o filme: "o que teria você feito? O que esperava que eu fizesse?" É um momento arrepiante que cristaliza aquilo de que "O Leitor" fala: do equilíbrio precário entre a luz e a escuridão, visto com a frieza decidida e distante do que poderia ser um filme ("tipicamente") alemão (e, de certa maneira, até o é; co-produção alemã, rodada na Alemanha com um elenco onde apenas Winslet, Ralph Fiennes e Lena Olin não são nativos).
Mas essa é apenas mais uma das ilusões de um filme que se esquiva a ser catalogado e está constantemente a mover o terreno debaixo dos pés do seu espectador. Não temos certeza que "O Leitor" seja um grande filme (há um final demasiado "certinho", por exemplo; há um requinte sem esforço que nos pergunta se há aqui de facto mais alguma coisa do que apenas uma adaptação de prestígio de um romance conhecido). Mas sabemos que nos deixa a remoer; e isso já é muito mais do que muitos grandes filmes contemporâneos conseguem.


12 Junho 2009 - Dúvida


Título original: Doubt
De: John Patrick Shanley
Com: Meryl Streep, Philip Seymour Hoffman, Amy Adams
Género: Drama
Classificação: M/12
Origem: EUA
Ano: 2008
Cores, 104 min
Site



Jorge Mourinha in PÚBLICO, 6 de Fevereiro
"Dúvida" não quer, nunca, ser mais do que o registo do trabalho de actor
Não se espere de "Dúvida" mais do que aquilo que é: a adaptação (eficiente mais do que inspirada), pelo próprio dramaturgo, da peça teatral que Diogo Infante encenou entre nós em 2007, com um elenco de luxo a brilhar muito alto nesta história sobre a fé e a dúvida, a bondade e a desconfiança, a intolerância e a abertura de espírito.
Num colégio católico do Bronx em 1964, a freira rígida que o rege com mão de ferro sente-se ameaçada pela lufada de ar fresco que o novo padre, progressista, traz, e uma jovem freira idealista que nota como o padre parece prestar especial atenção ao único aluno negro do colégio fornece-lhe a arma perfeita para ir atrás dele, levantando a dúvida sobre a idoneidade das suas intenções. John Patrick Shanley está objectivamente a "brincar com o fogo" na sua peça, ao introduzir questões de fé e de raça numa história inevitavelmente marcada pelos escândalos levantados pelo abuso sistemático de crianças por parte do clero americano, mas refreia inteligentemente quaisquer extrapolações abusivas ao concentrar a sua narrativa na batalha de certezas e dúvidas entre as três personagens principais, ao mesmo tempo que se retrai de inventar o que quer que seja visualmente para se limitar a registar as interpretações dos seus actores.
Claro que, com estes actores a carburar a cem a hora, dificilmente alguém ficaria mal visto - e se não há surpresa nenhuma em Meryl Streep e Philip Seymour Hoffman serem sobreexcelentes, como é seu hábito, é inevitável deixarmo-nos surpreender por Amy Adams e Viola Davis, porque não as conhecemos tão bem e a sua entrega em nada fica atrás da das "vedetas". "Dúvida" não quer, nunca, ser mais do que esse registo do trabalho de actor, e ganha-se nessa modéstia, mas faltalhe o rasgo que lhe permitiria dar o salto para um grande filme. Assim como assim, já não ficamos mal servidos.


Luís Miguel Oliveira in PÚBLICO, 19 de Fevereiro
A primeira homilia do padre Seymour Hoffman refere-se ao assassinato do presidente Kennedy, "sucedido no ano passado", mas o ambiente de "Dúvida" lembra menos os anos 60 dos que os anos 50. Os do senador McCarthy, e todos os filmes e peças teatrais ("Dúvida" também parte de uma peça do próprio Shanley) que se fizeram em parábola da "caça às bruxas" do senador. A "bruxa", aqui, é "moderna" (a pedofilia), mas no fundo é irrelevante, como irrelevante é a hipotética culpabilidade da personagem do padre: o que Shanley filma é a convicção irracional e a sanha persecutória da personagem de Meryl Streep (por sua vez uma espécie de "bruxa", bastante arrepiante). Há uma austeridade (totalmente justificada) no tom de "Dúvida", mas fica por decidir se é o produto de uma opção estilística deliberada ou, como algumas cenas deixam desconfiar, o resultado de um academismo a precaver os seus limites.


João Lopes in sound + vision, 7 de Fevereiro

Com a adaptação da sua própria peça, Dúvida, John Patrick Shanley recupera um cinema eminentemente ligado aos poderes da palavra e às suas ambivalências. Logo também às qualidades de representação de actores como Meryl Streep e Philip Seymour Hoffman, ou ainda de excelentes secundárias como Amy Adams e Viola Davis — este texto foi publicado, por João Lopes, no Diário de Notícias (6 de Fevereiro), com o título 'Efeitos e actores especiais'.

Há uma velha máxima que diz que, em cinema, o melhor efeito especial é o ser humano, quer dizer, os actores. Convenhamos que não é uma ideia muito acarinhada nos nossos dias, sobretudo se pensarmos que há todo um público (des)educado para pensar que o “verdadeiro” cinema acontece sempre que duas imagens nos oferecem pelo menos três explosões...
Dúvida não será exactamente um dos filmes mais perfeitos que já se fizeram sobre o conceito católico de culpa e as questões morais que a ela se associam (afinal de contas, convém não esquecer que, em 1953, Alfred Hitchcock dirigiu esse filme sublime que se chama Confesso, com Montgomery Clift). Seja como for, ao adaptar a sua própria peça, o trabalho de John Patrick Shanley possui o mérito de revalorizar um cinema em que a palavra emerge como matéria vital da acção. Em boa verdade, deveremos mesmo corrigir essa asserção: a palavra acaba por se confundir com a própria acção, no sentido em que, ao falarem, as personagens jogam todos os trunfos da sua identidade.
As peripécias do filme (situado em 1964) remetem-nos para um tempo com inevitáveis ecos simbólicos na actualidade. Estamos perante as feridas interiores de uma América marcada pela morte brutal de John Kennedy e,ao mesmo tempo, vivendo um processo imensamente complexo de interrogação dos seus valores morais, com especial incidência no estatuto dos afro-americanos. Nesta perspectiva, Dúvida recupera o olhar crítico do melhor “cinema social” dos anos 50/60 ligado a nomes tão díspares como Otto Preminger ou Sidney Lumet.

9 Junho 2009 - 14º Aniversário do Cineclube




Sessão especial: Apresentação Filminho 2009
Terça-feira, 9 de Junho, 21h30, Entrada livre



Caríssimos,

Junho. Na 6ª feira, dia 5, temos Bombos em Amarante e, como é habitual, não temos filme programado para esse dia.

Mas Junho é também o mês de aniversário do Cineclube de Amarante (CA).

O CA faz, no próximo dia 9, 14 anos de existência. Efectivamente, o primeiro filme – Forrest Gump – foi exibido a 9 de Junho de 1995.

Recordo.O CA é uma associação sem fins lucrativos vocacionada para a promoção e divulgação da cultura cinematográfica e crê prestar uma inalienável e insubstituível função à comunidade amarantina. Não só por se assumir como único exibidor de cinema na cidade, mas, sobretudo, por procurar manter um nível elevado de qualidade, evidente na selecção e projecção dos filmes apresentados. Versátil na sua programação, o CA procura cativar todos os (potenciais) espectadores: do cinema de autor, a filmes mais comerciais (como os premiados pelos Óscares), passando pelo cinema infantil. Outras iniciativas, como conferências, debates com realizadores, cinema ao luar, testemunham a matriz impulsionadora e o carácter dinâmico das actividades do CA (pronto, não tão dinâmico como podia - e devia? - ser….)

O que interessa é que durante este período, exibimos, em programação normal e ciclos temáticos, quase 1000 filmes, em mais de 1.300 sessões. Realizámos acções de formação, exposições, promovemos encontros com realizadores e actores, participámos activamente em seminários, colóquios e encontros sobre cinema, marcamos presença regular nos festivais e iniciativas de carácter cultural e cinematográfico.

Esta breve (espero) introdução para pedir a vossa particular atenção ao convite para a noite de 9 de Junho. Teremos bolo e espumante. Parece-me que – e apesar de – temos razões para comemorar. Apareça quem quiser. São todos bem vindos.

Manuel Carvalho

Convite


O Filminho é a Festa do Cinema Galego e Português, realizada simultaneamente em V. N. Cerveira e Goian (Tomiño), exibindo filmes de criadores-realizadores tanto portugueses como galegos. A particularidade deste festival radica na projecção dos filmes em competição em salas de ambos os lados da fronteira.

Como afirma André Martins, Director do Filminho, “é a magia da imagem que é celebrada”. E acrescentamos: E a magia (da imagem) porque se furta à clausura de espaços rígidos, sejam físicos ou mentais, é trans-fronteiriça. Porquê? Porque o Cinema é/deve ser manifestação desinteressada – no sentido kantiano – do Artista. Nesta medida é hierofania de uma singularidade criadora que aspirando à consagração (aceitação/rebelião?) universal se eleva, paradoxalmente, ao universo da trans-subjectividade. Como fim em si mesmo, o Cinema desvela-se enquanto Arte do vísivel, ou do sensível Absoluto. Mas também do Invisível. Do que não é imediatamente perceptível.

No dia 9 de Junho, o Cineclube de Amarante faz 14 anos de Existência. A Direcção do Cineclube decidiu comemorar o aniversário com Imagens. Imagens em movimento. Imagens partilhadas.Assim, exibirá 5 curtas-metragens, projectadas no Filminho de 2008, contando com as presenças do Director do Filminho, André Martins, do Programador português do Filminho, Paulo Martins e de um realizador (a aguardar confirmação de qual dos 5 estará presente. Só um que não há dinheiro para mais!!!).

Venha celebrar connosco a “Magia da Imagem”

A existência/resistência do Cineclube de Amarante

5 Curtas-metragens:

Ossudo
, de Júlio Alves, Animação, Portugal, 2007, 14'
Cousas do Kulechov, de Susana Rey, Experimental, Galiza, 2008, 21'
Antes de Amanhã, de Gonçalo Galvão Teles, Ficção, Portugal, 2008, 25'
Os Señores do Vento*, de Xurxo González, Documentário, Galiza, 2008, 10'
Deus Não Quis, de António Ferreira, Ficção, Portugal, 2007, 15'


*
Fragmento do programa da Televisión Galega Onda Curta com uma entrevista aos "Señores do vento" e ao realizador, Xurxo González.